segunda-feira, 16 de maio de 2011

Minha viagem com Hungria, Prússia e Inglaterra


Ainda sinto como se tudo não passasse de um sonho...



Tudo começou com uma visita de Hungria à minha casa. Servi uns doces que havia encomendado naquela manhã, mas antes que degustássemos o primeiro pedaço, aquele bisbilhoteiro (lê-se "Prússia") saiu de alguma moita e atacou um de meus pobres pedaços de bolo.

Claro que Elizabeth armou-se de sua frigideira e daí em diante só pude mensurar quantos hematomas Gilbert levaria para casa do Alemanha.

Bem, foi nesse meio tempo que Inglaterra apareceu. Convidei-o para tomar um chá (pedindo para ele ignorar a briga) e servi alguns bolos. Foi então que ele me falou de uma bela mansão em suas terras a qual iriamos gostar de visitar.

_ Uma Mansão? _ Hungria mostrou que estava ouvindo a conversa. Eu a vi segurando a gola de Prússia e pronta para dar a próxima panelada.

_ Sim, sim. _ Respondeu Arthur _ Ganhei este convite de um amigo de um amigo meu, mas é preciso mais três acompanhantes para viajar.

Estranhei. Eu não queria acreditar que o círculo social de Inglaterra era tão pequeno a ponto dele nos convidar. Tipo... Não somos amigos nem nada do tipo.

_ Então quer que nós viajemos com você? _ Gilbert se intrometeu.

_ "Yes, Gilbert" _ Arthur sorriu. E foi um sorriso estranho _ O avião vai sair ainda hoje. Se apressem, caso queiram vir. Nos reuniremos aqui mesmo, no final da tarde. Podem ficar tranquilos, vocês irão para meu país. _ Ele acenou, deu meia volta, e sumiu usando mágica.

Fiquei algum tempo olhando para o local onde estava Arthur há poucos segundos e "despertei" com os comentários de Prússia e Hungria sobre o tal convite. 

Sinceramente, eu estava com uma sensação ruim. Estava pronto para recusar, mas quando Hungria me perguntou se eu queria ir... Sei la, acabei aceitando.

No final da tarde, nos encontramos com Inglaterra no local combinado e aparatamos com a ajuda dele para o aeroporto (Nota mental: Não comer nada antes de aparatar). Não precisamos entrar na fila para o check-in e logo pegamos o avião para a Inglaterra.

Dentro do veículo, eu estava sentado próximo à janela e mantinha a cabeça encostada no vidro. Eliza dormia apoiada em meu ombro e, ao lado dela, Prússia roncava fracamente. Nem liguei. Ainda estava tentando refletir sobre o que me fez aceitar aquela viagem, pois a história de Inglaterra estava difícil de engolir. Convites pra uma mansão? Por que convites? Era uma espécie de hotel?

Ao chegar ao aeroporto, Inglaterra nos aparatou para outro lugar.

Um belo lugar, diga-se de passagem.

Acho que por alguns segundos me esqueci de piscar. Estávamos agora em um sítio pequeno e luxuoso. Tinha uma lagoa que águas cristalinas e uma grama verde-vivo. Era possível ver o véu de estrelas passando por nossas cabeças, dando a sensação que estávamos num planetário. 

Fiquei maravilhado.

Hungria então segurou meu pulso e apontou para a mansão rústica e bem trabalhada, parecia ser antiga. Tinha dois andares cor de marfim com detalhes dourados. Havia umas quatro janelas na frente, que chegavam até o chão ou então bem próximo dele.

Começamos a andar até ela.

Prússia caminhava bem atrás de nós, lento demais. Olhava para um ponto indefinido ao seu lado que, realmente, estava me incomodando. Acho que incomodou Eliza também, pois quando dei por mim, ela se aproximou dele e o puxou pelo pulso.

_ H... Hei! _ É, parece que Gilbert tinha voltado à realidade.

_ Deixa de ser lerdo! Nem parece que viveu em guerras, homem!

Acabei rindo da cena, mas isso logo passou quando observei Arthur mais atentamente. Ok, eu só podia ver a nuca dele, mas aquele andar rígido não me enganava. Afinal, sou uma nação com uma boa carga de experiência nas costas.

Paramos em frente á porta de madeira trabalhada e Arthur bateu nela usando a aldraba de metal. Enquanto esperávamos, Hungria se virou pra mim com ar de ansiedade:

_ Que lugar lindo, não? Já veio aqui antes?

_ Sinceramente, não, mas se for agradável poderemos vir mais vezes, o que acha?

_ Boa idéia!

Nos entreolhamos por um momento, até que o canto dos meus olhos acabou percebendo uma imagem que chamou minha atenção. Resolvi olhar para o lado e vi Prússia fitando o nada. Espere um pouco, ele estava pensando?!

Certamente aquele era um fato inédito.

Hungria sorriu e deu com a frigideira de leve na cabeça dele:

_ Au!

_ Terra para Gilbert Inútil!

_ Deixe-o Elizabeth, você interrompeu um momento raro da vida. Gilbert pensando. Creio eu, pelo menos.

Eu o vi fazer uma careta de poucos amigos. Como se eu ligasse... 

_ Fiquem quietos, por favor. _ Inglaterra resmungou _ Mal entraram e já estão agindo deste modo? Hnf.

Arthur bateu na porta mais uma vez e de repente ela se abriu, mostrando um casal que fez meu sangue instantaneamente gelar. Ambos eram muito pálidos e estavam bem abatidos. Carregavam malas pesadas e nos encaravam com os olhos bem ressaltados. Não sei se pareci grosseiro, mas acho que fiz uma careta na hora. 

Entregamos nossos convites e eles tentaram sorrir. Tentaram. Depois saíram às pressas da mansão, parecendo que iam tropeçar a qualquer momento com aquelas pernas bambas e fracas.

_ Bem... Er... _ Arthur passou a mão pelos cabelos e se virou para nós _ Eu vou cuidar das coisas aqui por baixo. Podem subir e desfazer as malas. Todos os quartos ficam la em cima.

_ Oh, sim, claro _ Falei.

Peguei minha mala e a de Elizabeth para subir as escadas e quando chegamos ao segundo andar, cada um escolheu um quarto.

O meu ficava de frente para aquele lago. Era uma vista bonita. Abri minha mala, guardei todas as roupas nas duas gavetas vazias da cômoda e me aproximei da janela para contemplar a paisagem. Meus olhos se perderam naquela grama tão viva...

De repente um vulto passou voando pela janela, bem diante dos meus olhos.

Pulei para trás e senti meu coração rapidamente chegar até o esôfago. Uma reação típica de quem é surpreendido, claro. Não sei como não gritei. Não acreditei ser impressão minha... Foi perto demais, demasiadamente perto.

Me afastei mais da janela e fui até o espelho, apenas para perceber a ausência de cor no meu rosto. Respirei fundo, passei as mãos pelo cabelos e desci para jantar. 

Nota mental nº 02 - Sempre perguntar quem fez a comida.

Isso porque se eu tivesse perguntado, não teria colocado aqueles scones na boca. Foi horrível! Eles já tinham chegado à minha garganta e aí comecei a tossir. Não sei se estava passando mal ou se era meu corpo me insultando por ter colocado aquilo na boca. Ouvi as vozes de Hungria e Prússia (este último gritando algo como "scones da morte") e nesse desespero olhei para o lado e tossi tudo de vez. Acho que toda massa saiu da minha boca...

...E foi parar tudo na cara de Prússia.

Se Gilbert fosse uma nação, teria declarado guerra contra o território austríaco naquele momento. Claro que o "jantar" se resumiu a uma confusão que nem vale a pena ser narrada. Só posso dizer que terminei com a roupa cheia de comida, e tive uma briga com Gilbert, a qual se estendeu até eu levar um sermão de Inglaterra.

Voltei para o quarto, tomei um banho e coloquei o pijama, pensando onde eu estava com a cabeça ao aceitar viajar com aquele protótipo de nação.

Era melhor dormir e torcer para o dia seguinte ser melhor

E dormi...

...

Foi quando tive meu pior pesadelo

Meu corpo estava mergulhado na escuridão e pude ouvir uns sussurros infantis se estendendo pelo espaço. Procurei ver de onde vinham, mas não enxergava sequer meu corpo.

Então vi um flash e de repente a cara medonha de uma garota com olhos sobressaltados, cabelos esvoaçantes e boca muito aberta apareceu a poucos milímetros da minha. Nem deu tempo de gritar, até minha voz havia sumido.

Tudo escureceu de novo, e dessa vez ouvi um rápido grito seguido de uma lâmina ser cravada em meu tronco, rasgando minha carne. Não sei se foi sonho, mas a dor que eu senti foi tão real que não aguentei e acabei gritando. Sentia a lâmina se aprofundar e cortar-me vagarosamente com o único fim de me torturar. Minha cabeça girava e sons pairavam desordenados dentro dela.

Um grito agudo e infantil ecoou estridente na minha mente e logo tudo desapareceu.

Até agora não sei o que foi sonho e o que foi realidade...

Nem faço idéia...

Quando abri os olhos, estava deitado no chão da cozinha, com a cabeça no colo de Elizabeth. Senti sua delicada mão em minha fronte e pude ver o rosto preocupado dela. Inglaterra também estava próximo e percebi a mandíbula rígida dele, como se quisesse me dizer alguma coisa.

_ Roderich! _ Hungria sorriu aliviada _ Que bom que acordou!

_ ...

Sentei-me atordoado e toquei na cicatriz que vi em meu corpo. Então aquilo foi real? Tentei me lembrar do rosto que vi em meu sonho. Era uma menina de olhos claros, sim... Uma pele muito maltratada e cabelos bem escuros... Acho que eram negros.

Levantei-me para sentar em uma cadeira e colocar as idéias em ordem. Tudo estava tão confuso que sequer consegui formular uma pergunta.

_ Tome, vai lhe fazer bem. _ Arthur me ofereceu café.

Logo depois nós três vimos Gilbert chegar ferido e mancando com sofreguidão. Hungria levou as mãos à boca assustada ao ver o estado de Prússia e rapidamente correu para apoiá-lo antes que caísse de vez no chão. Olhei para a cena confuso, sem saber o que dizer.

Eliza guiou Gilbert até uma cadeira enquanto Inglaterra permanecia com os olhos arregalados diante da situação.
_ E então, macumbeiro enganador? _ Prússia inquiriu furioso, erguendo um dos braços impacientemente _ O que tem a dizer sobre isso? Não foi para passar as férias que nos chamou aqui, certo?

Arthur saiu de seu estado de transe e piscou várias vezes. Em seguida fechou os olhos, bufou e puxou uma cadeira para sentar-se perto de nós.

_ Não achei que o fantasma reagiria agressivamente. _ Ele respondeu _ Pensei que, vendo os dois, ela pelo menos daria pistas mais precisas. E deu. Mas não do modo que pensei que seria. Que besteira a minha. _ Prosseguiu e tirou um livro antigo, sem nada escrito na capa ou contra capa, de dentro do casaco.

Hungria arregalou os olhos e quase degolou o loiro.

_ Fantasma?! Esta Mansão aqui é assombrada?! Ahhhhh! Artie, é bom indo explicando logo ou eu não vou hesitar em usar minha frigideira em você!!

Já eu balancei minha cabeça ainda em estado perplexo e acabei falando a única frase coerente que consegui elaborar:

_ Mas por que logo eu? O Gilbert é bem mais propenso a problemas.

É verdade. Vai dizer que não?

Inglaterra suspirou e folheou o tal livro enquanto explicava:

_ Bem, de acordo com o que busquei, é uma história bem antiguinha, até. Eliza, cuide dos ferimentos do Prussia e se sente também.

Vi Hungria resmungar e atender ao pedido.

Bem, pelo que eu pesquisei, a garota era filha de uma das famílias mais ricas desta cidade, no século XIX. Mas, como nem tudo que reluz é ouro, o pai abusava constantemente dela, fora as vezes que a deixava sem água e comida. E a mãe não podia fazer muita coisa, senão sofria as mesmas consequências. Ele as tratava como brinquedinhos sexuais e escondia isso sobre os panos da sociedade daquela época. Era realmente cruel.

Até que teve um dia que a criança não aguentou e desamaiou, ficando em estado de coma. Como o covarde não ligava muito para ela, mandou seu amigo médico enterrá-la, achando que estava morta. Ele errou. E pior, o médico sabia disso. Mas como soube? De acordo com as minhas pesquisas, ele era necrófilo. Tentou abusar da garota, mas ela acordou antes do ato. Assustada, ela se encolheu em um canto. O médico se passou por bonzinho e lhe enganou com palavras tentadoras, como um lar e um pai correto.

Mas, foi até pior. Ela se tornou empregada dele e além dos abusos e da fome, ele ainda torturava a coitada, tanto físicamente quanto verbalmente, falando em como ela era fraca e não merecia ser a herdeira da família em que nasceu. Não aguentando a vida que viveu, cometeu suicídio se jogando do segundo andar da Mansão. É por isso que ela só aparece no segundo andar da casa. Portanto, estamos seguros aqui, por enquanto.

Quando acabei de ouvir a história, baixei a cabeça e respirei pesarosamente. Meu governo está se empenhando em fazer leis mais rígidas porque... Infelizmente tivemos problemas nesse sentido...

_ Nossa! Que dureza... _ Gilbert comentou _ Mas ainda não entendo por que ela nos atacou, nem por que ainda está viva.

_ Bem, aqui estão umas fotos do médico e do pai da garota, já que você quer saber.

Inglaterra deu duas fotos avulsas do livro para mim e Gilbert, e quando coloquei os olhos nelas, meus óculos quase escorregaram da face. Por sorte consegui segurá-los a tempo.

O pai e o médico era exatamente iguais a mim e ao Gilbert.

_ I... Isso é um insulto a minha pessoa! _ Exclamei irritado, finalmente de volta ao meu estado normal. Ter a mesma aparência de um daqueles desgraçados era simplesmente uma ofensa do destino _ São praticamente nossas cópias!

Prússia piscou várias vezes e só depois de sair do choque perguntou:

_ Bem, mas quem aí é o médico e o pai da garota?

_ Roderich seria o doutor e Gilbert o pai. _ Respondeu Inglaterra.

Senti meu rosto queimar e certamente era de raiva. Transtornado, desviei minha atenção para as páginas do livro e só então percebi.

Era a garota do meu pesadelo.

Certamente achava que Gil e eu éramos os ofensores dela e agora queria se vingar.

_ Era essa menina que estava no meu sonho e me cortou ao meio _ Confessei _ Será que ela controla os sonhos, também? Oh meu Deus, se for verdade acho que nem dá pra dormir. Vamos ter que ficar acordados.

_ Tem razão _ Arthur afirmou _ Melhor vocês dois ficarem acordados, a menos que queiram ter um novo pesadelo.

_ Isso mesmo... _ Hungria dirigiu-se ao armário de louças _ Vou preparar mais um pouco de café caso precisem.

_ Droga. _ Ouvi Prússia bufar enquanto passava a vista no livro ... E ele tinha razão, infelizmente. _ Ué, onde está o broche?

_ Que broche? _ Indagou Eliza, que depois voltou seus olhos ao livro e também viu. Eles se referiam ao broche que aparecia na foto com a garota. Realmente, no meu pesadelo ela estava sem qualquer adorno _ Ah. Este. Tenho a impressão de tê-lo visto em algum lugar.

Inglaterra olhou perplexo para a jóia que Hungria carregava:

_ Você sabe onde está? Gilbert, você que ficou mais tempo no quarto, viu algo referente ao broche?

_ Bem, tenho a impressão que vi no meu quarto _ Confessou Eliza enquanto olhava para cima.

_ Eu vi umas coisas sinistras no quarto do aristocrata quando o vimos desmaiado! _ Gilbert declarou _ Tinha umas coisas escritas com sangue na parede. Ahn... Tinha "Me devolva" e "Você terão que tê-los". Ah, e não é só isso. Depois daquela guerra de comida eu fui para o meu quarto, me olhei no espelho e... Er... Bem, eu vi a imagem de um ursinho cinza flutuando atrás de mim. _ Percebi que ele ficava mais pálido à medida que falava _ Olhei pra trás e não vi nada! Então voltei a olhar para o espelho e vi o reflexo do ursinho mais perto do meu e o bicho ainda chorava sangue! Foi muito bizarro! Depois senti alguém segurar meu braço esquerdo e quando fui ver... Não tinha nada, mas meu braço tava gelado!

Lógico, todos nós ficamos calados e com aquela terrível sensação de assombro.

_ Eu vou pegar o broche _ Falou Hungria.

_ Eliza...! _ Chamei.

_ Não se preocupe, acho que não corro o mesmo risco que vocês.

E sem dizer mais nada ela subiu para o segundo andar. Ficamos esperando e nos seguramos para não irmos atrás dela. Finalmente Eliza desceu, já com o broche na mão e o rosto muito pálido.

Inglaterra ficou pensativo e depois que um tempo, suspirou e finalmente disse algo:

_ É o seguinte, amanhã voltaremos para lá. E se qualquer um ver a pequenina, entregue o broche a ela. Pode ser nosso único modo de acabar com maldição de uma vez por todas.


Acabei passando a madrugada fazendo o que eu menos imaginava fazer: Ficar acordado com Prússia, jogando video-game na sala de estar, enquanto Hungria e Inglaterra dormiam profundamente, cada um em um sofá. O volume da televisão estava muito baixo e nenhum de nós falava alto. Cheguei a jogar umas partidas de Mario Kart, mas depois fiquei assistindo ao Gilbert jogando Final Fantasy. Não era ruim, parecia que eu estava vendo um daqueles filmes computadorizados.

Eu estava deitado no carpete, com a cabeça apoiada numa almofada, e de vez enquanto me pegava pensando no tal urso de pelúcia, cujo reflexo apareceu no espelho.

Mais que isso. Prússia disse que leu a frase "vocês terão que tê-los" em minha parede. "Tê-los"... Plural... Então talvez a tal assombração esteja se referindo a mais de uma coisa.

E quando dei por mim, vi os primeiros raios do amanhecer atravessarem a janela. Pena que não tive tempo para contemplar, fiquei mais preocupado com o que aconteceria nas horas seguintes.

O último ronco de Arthur me assustou. Ainda deitado, olhei para cima e o vi de pé, com os cabelos mais bagunçados que o normal. Hungria acordou logo em seguida. Seus cabelos estavam bem emaranhados, mas ela não ligou pra isso. Meramente esfregou os olhos e bocejou.

_ Uaaa... Bom dia _ Ela nos cumprimentou rotineiramente _ Querem que eu faça um café?

_ Não, obrigado... Acho que já bebi isso mais que o próprio América.

Gilbert largou o controle do game e suspirou cansado.

_ Eu também passo.

Eu me levantei e fui até o banheiro para deixar minha própria cara num estado mais apresentável.

Tivemos um dia "normal" comparado com a madrugada conturbada. Tudo o que tivemos que fazer era ficar longe do segundo andar. A razão por eu não ter ido embora da casa é porque queria fazer algo pela pobre garota. E tínhamos um plano, o qual seria executado próximo da meia noite, que era quando visitaríamos a zona proibida.

Durante um o almoço da vi Gilbert falando com Alemanha pelo celular, dizendo coisas como "você foi tudo pra mim, desde que era criança", "se eu não sobreviver, vou sentir sua falta" e coisas do tipo, sem no entanto, explicar o motivo de todo aquele drama.

Era uma cena patética, sério.

O resto do dia, passei na sala de estar, sentado em uma poltrona e refletindo sobre algumas questões


Nada me tirava da mente aquele desabafo de Prússia sobre o ursinho. E se ele fosse importante?

Não sei o que se passou pela minha cabeça, mas me levantei e me aproximei da escada. Subi o primeiro degrau. Será que eu estava com medo? Sou uma nação, certo? Não há como morrer que nem os humanos... Certo?

Subi os próximos degraus determinado. Não sei por que um broche e um bicho de pelúcia poderiam ser tão importantes assim para um fantasma. Lembranças da mãe, talvez?

Isso...! Lembranças...

E se a única pessoa que a menina tinha na vida era a mãe dela? Se na casa do pai só tinha o colo materno, na casa do médico nem isso havia.

Com esse sentimento de angústia cheguei ao segundo andar e fui imediatamente ao quarto de Gilbert. Afinal o urso tinha aparecido la, certo? Vasculhei a penteadeira, o guarda-roupas, a cômoda... Nada. Então saí do local...

...Mas mal atravessei a porta quando a garota surgiu bem na minha frente

Foi uma sensação terrível. Impensadamente, girei os calcanhares e corri dali. Vi a menina voar atrás de mim como ave de rapina. Eu estava sem o broche e aquilo não fazia parte do plano.

Corri até meu quarto com a mesma velocidade de Itália Veneziano ao ver um batalhão inimigo, e me atirei com tudo na porta antes de entrar.

Claro que eu não estava seguro ali. Foi sorte que a garota não tivesse atravessado a porta para terminar o serviço. Talvez fantasmas não tenham senso de direção, não sei. Passei a procurar ali o ursinho. Nada nas cômodas, nada na penteadeira...

...Mas no guarda-roupas havia uma pequena caixa de madeira.

Abri-a, e lá estava o maldito urso. Só que não era cinza, era rosa.

Suspirei aliviado. Se minhas deduções estivessem corretas, então eu já teria com o que presentear o fantasma quando o reencontrasse.

Quando desci novamente as escadas, encontrei Elizabeth, o qual havia acabado de entrar na sala. Ao me ver no primeiro degrau, ela abriu a boca alarmada e correu em minha direção.

_ Áustria!

Hungria fez menção de tocar em meu rosto, mas segurei-lhe a mão como forma de dizer que não precisava se preocupar.

_ Estou bem... Só precisei pegar isso. _ mostrei a pelúcia _ Desculpe-me, mas não era algo que eu queria fazer acompanhado.

_ Não se trata de querer! Poderia ter se machucado!! _ Ralhou com certa potência na voz _ Por que não me pediu pra procurar isso?

Claro que eu conheço o lado agressivo de Hungria, éramos inimigos na infância. Por isso fiquei calado.

Quando o relógio apontou 23:30 hs, Inglaterra se uniu a nós, seguido de Prússia. Este último ainda estava com as pernas enfaixadas.

Percebi que os olhos de Gilbert focaram o urso que estava em minha mão assim que ele se aproximou de mim. Vi seus lábios se moverem de uma forma quase automática antes de perguntar:

_ Por que está segurando esse urso maldito?

Eu olhei para o objeto e suspirei:

_ Gilbert, encontrei isso... Enquanto ia pro meu quarto. _ Mordi o lábio inferior nesse meio tempo _ Sei que foi arriscado, mas é nossa segunda opção. Até porque, você comentou do urso, correto?

Ele ficou  em silêncio, me olhando de um jeito estranho. Parecia... Preocupado? Oh, não, não mesmo! Era mais fácil acreditar que Suíça tinha aderido à campanha do desarmamento.

_ Bom, já que estamos todos aqui, mais alguma palavra? _ Inglaterra perguntou.

Ninguém respondeu

Hungria foi na frente, já com o broche na mão:

_ Nunca tentem tocar nessa coisa _ Ela dizia enquanto subia às escadas _ Eu cheguei a ouvir gritos e choros que davam até medo.

_ Então realmente é da menina... _ Concluiu Inglaterra.

Uma vez no segundo andar, voltamos ao meu quarto, mas quando abrimos a porta vimos um cenário um pouco diferente. Parecia um quarto de criança, só que com um ar de assombro. Havia sangue nos cantos das paredes, bonecos com as cabeças arrancadas, arranhões na cama...

E bem na nossa frente, de pé, o fantasma.

_ Vocês trouxeram o que eu pedi? _ Ela apontou para os escritos na parede.

_ Sim. _ Eu respondi, aproximando-me dela e entregando o ursinho. Eliza entregou o broche.

Vi a menina sorrir em agradecimento. Por um momento, não consegui mais ver a figura medonha que nos ameaçava. Dessa vez só vi uma garotinha.

Então ela sumiu.

Tudo parecia ter acabado bem, mas de repente ouvi um grito de Inglaterra:

_ PRÚSSIA!

Quando Hungria e eu olhamos para trás, vimos que a garota havia se materializado na frente de Gilbert e o enforcava com fúria enquanto as pernas mantinham-se entrelaçadas em sua cintura. Começamos a gritar desesperados. Inglaterra e eu avançamos na agressora para tentar salvar a vítima e percebi que, estranhamente, a menina parecia sólida. Sólida como um cadáver gelado e viscoso, apertando com tanta vontade o pescoço de Gilbert que já estava deixando-o roxo.

Então Eliza acabou gritando de repente:

_ E sua mãe?! _ Ela desafiou _ Como reagiria vendo a filha desse modo, igual ao pai?! Pense nela pelo menos!!!

A garota foi atingida pelas palavras e imediatamente soltou Prússia, o qual caiu no chão sem forças. Eu a vi chorar atônita e depois voar até Elizabeth. Quis reagir, mas, ao contrário do que eu esperava, a garota começou a desabafar em lágrimas no colo dela. Não estava mais sólida.

Ouvimos aqueles soluços sufocados em meio às súplicas da menina, enquanto Prússia tossia buscando o ar e se colocava de pé com minha ajuda e de Inglaterra. Havia uma marca forte em seu pescoço, consequência da tentativa de estrangulamento.

Hungria consolava a garota como se fosse uma verdadeira mãe e talvez isso tenha sido o alento que a menina tanto precisava. Seu choro partia o coração, tanto que até Inglaterra, Prússia e eu esquecemos nossos medos e tentamos confortá-la xingando aquele pai e aquele médico desgraçados.

Por fim, a menina pediu desculpas e disse que não queria mais ficar sozinha. Queria ser livre daquele sentimento finalmente. Foi quando vimos o corpo dela brilhar e, em seguida, desaparecer aos poucos.

Antes de sumir eu vi o pequeno sorriso da garota. Acredito que agora ela poderá descansar em paz.

Quando tudo acabou, fiquei tão aliviado que senti que ia desmoronar.

Claro que fomos embora no dia seguinte. Que aventura, heim!

Quando cheguei à minha casa, apenas tomei um banho, me deitei na cama e fiquei a toa o dia inteiro.


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